Um suspiro… Um sorriso… Um sonho perdido no infinito mar de ruínas onde
quem reina é a Desilusão. Duas voltas ao mundo não chegariam para atenuar a
dor. Doce alma minha foi deixada à deriva no horizonte estrelado… E tu? Foste substituída
pela maldição da visão… Tu que durante tempos lutaste contra dragões e
batalhaste em guerras nos confins do guarda-roupa. Tu que tentaste libertar-te
da magia negra. Tu que tentaste ajudar-me a viver. Tu que durante anos sofreste
em silêncio tentas agora regressar a mim. Tentas arduamente livrar-me da
maldição.
Duas passos em diante… Três passos para trás… Estás sempre um passo
atrasada. Talvez eu não valha o trabalho de ser salva. Sim, deves voltar para
mim mas não deves lutar… Eu abro o caminho… Eu elimino qualquer obstáculo que
possa ser criado… Talvez deva ser eu a derrotar a maldição… Dois suspiros… Três
lágrimas… Um sorriso leve… Compaixão… Talvez a maldição seja na verdade o dom.
Doloroso… Os dons nunca são tão fáceis por esse motivo é que eles são chamados
de “maldições”. Dor… Lágrimas… E no final alegria por ter sobrevivido, por ter
feito algo de bom com o “dom”. Nada mais…
Miséria… Pobreza… Felicidade… Demência… Amor… Todos temos… Todos vemos…
Todos passamos ao lado e tentamos fechar os olhos. Três saudações… Um adeus…
Dois abraços apertados… Daqueles em que os nossos braços se recusam a largar a
outra pessoa. Maldição… Não mereço? Não merecemos todos? Será que ninguém
merece? Não há respostas. Três mil perguntas… Uma resposta… Sete perguntas
novas… O tudo e o nada juntos. O coro dos anjos invisível à nossa perceção.
Um sonho dissipado… Um novo sonho construído através de desejos e pedidos
à primeira estrela da noite. Dois desejos pedidos ao génio. Coragem… Confiança…
Ao terceiro nada mais que a liberdade. Um génio da lâmpada libertado do contrato
e para sempre livre. Amizade… Bondade… Os desejos pedidos ao génio e os pedidos
suspirados à estrela são apenas tentativas de trazer de volta a inocência e
pureza que quando criança possuía.
Não serei a luz… Não serei o fogo… Não serei nada mais nem nada menos que
uma peça do meu próprio jogo. Não serei o corvo que diz “Nunca mais…”. Nem
serei a Annabel Lee, jovem amada do poeta e cujo amor era cobiçado pelos anjos
e demónios. Serei eu própria! Amaldiçoada com um dom e com uma alma de
guerreira feiticeira. Conquistarei os corações dos anjos e demónios com as
palavras mágicas que me foram concedidas. Tudo isso, nada menos…
Abraçarei os outros com os braços com que enlacei o meu corpo partido. Ajudarei
a colar todos os bocadinhos do vaso de porcelana que se vão partindo ao longo
da vida. Chamarei quantas vezes forem as necessárias a minha alma. Lutarei
pelos sonhos lado a lado com a Primeira Estrela e a Lua. Libertarei todos os
génios dos seus contratos. Sorrirei para o Sol tal como ele me sorri.
Suspirarei por detrás das máscaras que me vejo obrigada a colocar. Tudo isso,
nunca menos…
Retirarei quando necessários todas as camadas de mim. Levarei os outros a
mundos desconhecidos, mundos de sonho e imaginação, mundos distantes que só eu
conheço. Abraçarei o dom amaldiçoado… Dom das palavras… Dom da visão… Suspirarei
mil vezes por amores… Farei outros seres emocionais pelas minhas histórias… Olharei
para mim e para o mundo e direi: Dois passos em frente, um sonho no futuro, três
desilusões no passado e um presente contínuo.