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quinta-feira, 23 de maio de 2013

Lutar e amar. Sorrir, chorar... Perder ou continuar?

Espalhados pelo mundo, tristes e inconsoláveis,
Na negra realidade que nos abraça diariamente.
Andamos na rua, sozinhos... Na mão direita
O relógio, na esquerda o tela solenemente
Pintada com cores vivas terrivelmente insolúveis...
E não vá a sombra deita-las na cama imperfeita.
 
Dia após dia, fechados na gaiola de rubi e diamante,
Ouvindo a canção suave dos anjos e esperando
Que um dia sejamos salvos, passando a viver.
Ouvimos uma voz a dizer para perdoar, e navegando
Pelo mar orientados pela Lua e o seu antigo amante,
Chegamos à Ilha Branca. Continuar ou perder?
 
Ouvimos os passos constantes e harmoniosos
Dos seres da ilha. Saltar para terra ou para o mar?
Sorriso nos lábios, lágrimas nos olhos e gritos abafados.
Lutar e amar. Sorrir, chorar… Perder ou continuar?
Ficar para trás ou seguir? Dar passos cuidadosos…
Preto no branco… Perdidos no tempo. Abandonados…
 
Olhamos para o relógio. O tic tac frenético e vibratório
Assombra o nosso corpo. A tela gelada e a tinta esbatida
Na face perdiam cada vez mais a cor. O mar violento
Ameaçava virar o barco, decidindo se a vida retida
No purgatório devia perder-se no denso e acusatório
Manto azul negro, ou sobreviver no puro elemento.
 
Por fim saltamos. Caímos sonoramente na terra ríspida.
Sentimos o ressoar do tambor, num som constante.
Antecipamos o que pode acontecer. “Fugir ou lutar?”
Dizemos para nós próprios. Uma seta incandescente
Perfura o teu peito rígido. E a substância liberta a vida
Que antes te pertencia. O vermelho na pele brilhante…
 
O calor a perder-se por entre os meus dedos quentes
Enquanto o líquido irrompia do teu corpo leve e frágil.
Um pesadelo! O tic tac do teu relógio desaparecia
Com som do tambor. E o mar, destemido e ágil,
Remexia-se com os inúmeros passos veementes.
 “Adeus…” Suspiraste. O ‘Nós’ teimava e fugia.
 
Largaste a tela vazia. Sorriste com uma lágrima
A escorrer pela cara. Apanhei-a ainda tremendo…
Lutar ou morrer? Levei as mãos à terra e procurei.
Procurei algo. Lutar. O “nós”, o “eles”, a mínima
Luz que brilhava do Sol dizia: “Vive!”. O horrendo
Final! Que importava o “nós”? Só tu… O Rei…
 
Prometera à Senhora proteger-te. Jurara a mim
Própria fazer de tudo para não destruir o que era
E sempre fora importante. Mas agora, perdia.
Sofria silenciosamente… E eu procurava o fim.
Fim do sofrimento… Fim… O relógio morrera.
O vermelho manchou a areia bege. Eu sabia…
 
Um grito... Milhares de lágrimas… Um homem…
O vento rodeou-nos. Perdidos neste submundo.
O leito imortal de areia tinha sido tingido com cor.
A energia do Sol e das vozes, que agora consomem
O mar, fizeram o teu corpo vazio ganhar um segundo
E vibrante calor. Explosões ocorreram. Adeus dor!

domingo, 19 de maio de 2013

O som da natureza e a dança da sombra

     Uma sombra cinzenta veio ter comigo. Era de noite. Uma noite pálida. Sem lua, sem estrelas que pudessem brilhar totalmente irrompendo as nuvens. Ela dança em meu redor. A música frenética do mar num embate irregular com as rochas acordava aos pássaros noturnos. Frente, trás! Boom! Frente, lado, trás! Bang! Boom! Trás, direita, trás, frente! E continuava a dançar em meu redor. Uma coruja voou perto de nós. Voou em pique. A sombra rodopiou. Saltou para frente… Perdi-me nos seus movimentos.
     O som do vento tornou-se o som dos violinos. A orquestra começou. Despertei e segui a sombra. Segui o rasto de pegadas vermelhas invisíveis. Soltei um uivo. Parei. Rodopiei como a sombra. Frente, trás! O mar colidia contra as pedras frias. Para frente e para trás. A sombra vibrou ao meu lado. Vi o lobo cinzento aproximar-se. Dei um passo. Frente, trás… Olhos nos olhos… Um rodopio da sombra… Um passo do lobo… Tic tac… Tic tac… Jurava que conseguia ouvir o relógio da sala. Mais um passo… Um rodopio… Um voo…
     Fechei os olhos, inspirei. Frente, trás… O vento fez o meu cabelo voar e perfumou-o com o cheiro do mar. Direita, esquerda, trás… Um rodopio… Um salto… Uma queda… Um uivo… À minha frente o lobo tinha desaparecido. A sombra mantinha-se em pontas de pés, pronta para mais um salto. Sustive a respiração. Saltei. Dissipei-me no ar. Sorri… Tic tac… Tic tac… Lá estava o relógio. Cai… A sombra acenou. Dizia adeus. Frente, trás… Cai na água. Dissolvi-me. Um último suspiro.
     Tic tac… Tic tac… Adeus… Bem-vinda… O mundo sem fim… Um último sonho… Um último suspiro. O som do violino. A dança angelical. Uma queda e um voo. O mar frenético e o vento a embalar. Boom! Baam! Sentia o meu cabelo a tocar-me na face. O perfume do mar a delirar. Um passo… Dois passos… Três passos… O silêncio profundo na escuridão. O vibrar silencioso do chão invisível. Frente, trás. Direita, esquerda… E por fim, nada! O final…