Vieste ter comigo, disseste que precisavas de ajuda, coisas normais.
Sorri e não mostrei a dor que sentia das inúmeras facadas que estava a receber.
Nunca choraste no meu ombro apesar de por milhares de vezes eu ter dado com
aquela aura de tristeza que te rodeava como se os anjos tivessem descido apenas
para testar a tua força de vontade. Vi-te a afastar, a correr para bem longe de
mim, talvez tenhas visto as mil carcaças que tenho no meu passado e não
quiseste arriscar a ser mais uma naquela imitação de Vale dos Reis.
Apenas posso olhar para ti, distante como se vivesse noutra realidade. As
nossas mãos nunca se tocaram e os teus lábios nunca foram meus, talvez não
estejam destinados a ser. Antes quando me perguntavam se tinha sonhos eu dizia
que tinha sonhos de dia e noite, que queria viver mais um dia e conquistar
todos os meus objetivos se assim tivesse destinado mas que nunca ia desistir.
Agora tenho mais um: ver-te feliz. Mesmo que não possa ser eu a fazer-te feliz,
desejo que alguém te faz sentir bem e te ofereça todo o amor e carinho que
merece. No final vou acabar por sair magoada mas eu sairia de qualquer das
formas. Será mais um tesouro perdido na pirâmide escondida do faraó, rodeado de
mil e uma múmias e protegido por armadilhas mortais que acumularam esqueletos.
Posso não ser a mais bela da zona nem a mais inteligente e é claro que
dei um enorme banquete de insetos mas eu sou a contadora de histórias e espero
que isso sirva para alguma coisa no final da minha vida quando eu própria for
consumida pelo fogo que me deu vida. A minha mente pode ser mórbida e macabra,
posso viver num mundo da fantasia sempre que escrevo e por isso não tenho
direito de te pedir para me abraçares. Apesar de sempre que o meu peito doí e
as lágrimas tentam rasgar a mascara de pele que cobre o meu rosto, a única
pessoa que me vem à mente seres tu, eu vou deixar-te ganhar asas e voar livremente.
Primeiro e último. Talvez o seja. Ficarei marcada para sempre com o teu nome
no meu coração petrificado. Posso ser jovem, posso não ter a sabedoria dos mais
velhos, posso estar sempre a errar, posso mentir, posso deixar de lutar mas nunca
serei a mesma porque decidir que te iria amar. Posso apenas ser quem te ajuda
com coisa triviais e saber isso magoa. Morro e renasço vezes sem conta. Nos
meus sonhos massacro milhares de pessoas e tu assustado e paralisado com a
minha imagem ensanguentada, choras. Não quero que chores. Não quero que penses
que sou um monstro. Não irei destruir todos só porque não podes ser o meu
parceiro. Prefiro sofrer.
Se os demónios e os anjos se unirem para te levar então de bom agrado me
darei para que possas viver nos braços de quem queres. Se eles me amaldiçoarem
e obrigarem a viver sem ti então talvez noutra vida fiques nos meus braços.
Ficarei à espera desse dia, mas viverei para tentar ultrapassar a cruel
injustiça de não te possuir. Como uma tela, pintada calma e carinhosamente,
assim também ficaram gravadas as memórias, imortais e a preto e branco. Se tenho
de ir para o túmulo então irei com as memórias de um amor persistente e doce.
Saber que os sentimentos não são mútuos não me faz parar, é como se eu tivesse
sido intoxicada pelo desejo e pela dor que sinto sempre que vais na direção oposta.
Sei que sou doida, devia deixar de te amar, devia arrancar este pedaço do meu
coração e dá-lo aos demónios mas eles gostam de me ver a sofrer, é mais
gratificante do que receber apenas um pedaço de coração.
Salvação. Não tenho salvação. Morrerei e pronto. Talvez te devesse dar o
meu coração, arranca-lo do peito e mostrar a todos como ele bate. Como ele bate
aceleradamente sempre que está perto. Dizer-te que não quero desistir mas se
não o fizer temo que os anjos e demónios se fartem de mim e se virem contra ti.
Eles não me farão mal mas receio que não tenhas a mesma sorte. Quero dizer-te
que sonho contigo todas as noites e que não desejo que te afastes. Mas é possivelmente
demasiado tarde para isso. Os nossos lábios nunca se tocarão e os teus braços
nunca serão o meu conforto. Estou sozinha com a solidão e os fantasmas do
passado. Tenho a certeza que antes tive este sentimento e no final os demónios
resolveram cobrar a divida e retiraram brutamente o meu coração. Cortaram-me ao
meio e disseram que se alguma vez eu quisesse voltar a sentir o mesmo teria de
lhes deixar observar a minha destruição, e eu deixei.
Meu amor, nunca direi o teu nome em voz alta. Continuarem aqui a sofrer
em silêncio como uma estátua. Colocarei a mascara e dizer que sim. Não te
abandonarei e tentarei seguir em frente levando comigo todos os demónios e
anjos que ameaçam cortar a tua cabeça e oferecer-ma num espeto, sem olhos pois
esses são a janela para a alma e com a boca cosida para que nunca fales. Para
teu bem vou recuar três passos por cada passo que der na tua direção. Vou
ajudar-te quando puder e tentarei não apoiar-me em ti. Deixarei para a noite a
dor, porque é preferível chorar quando não estás comigo, não correrei o risco
de te levar para o túmulo mais cedo do que é previsto. E se um dia eu for
primeiro tentarei esperar por ti e tomarei conta da tua vida. Não deixarei que
caias na tentação ou que te vendas aos demónios.
Adeus meu amor. A minha alma não será separada e depois do corpo padecer
ela continuará a lutar contra todo os assassinos que querem a tua pele. Se
fores tu primeiro eu procurar-te-ei na próxima realidade. Não sei se és o único
mas por agora és e isso é que importa. Não posso deixar os demónios andarem por
ai livremente, pois eles podem torturar e matar outras pessoas e já chega de
corpos na minha vida, por isso tenho-os perto de mim e espero que compreendas
quando um dia eu deixar de falar. Não é por ter desistido, não é por já não
quere ser tua amiga, apenas não podia viver sabendo que no final eu fui a causa
da tua infelicidade. A tua infelicidade passa a ser a minha infelicidade. Já o
contrário não se aplica e isso deixa-me um pouco mais descansada. Apenas ouvir
a tua doce voz chega por agora. Apenas dizeres “Olá” chega para eu saber que
não sou invisível. E se queres a minha ajuda e se pedes por ela, eu estarei lá
para assistir como uma escrava, só que não por imposição, uma escrava do meu
próprio sentimento.
Não és o cavaleiro no cavalo branco, nem a estrela mais brilhante do céu.
És apenas um homem que aos meus olhos merece a felicidade primaveril todos os
dias da sua longa vida. Não vieste com o amanhecer nem com o anoitecer. Não te
prometo a lua nem fortuna. Não te posso dar imortalidade corporal mas posso
dizer que a terás. Serás imortal no coração das pessoas, principalmente no meu.
Não sou uma deusa nem um anjo ou demónio. Sinto os horrores de inverno todos os
dias da minha vida. Vejo sonhos a morrerem e vontades a fugirem. Não quero que
seja mais um sonho que depressa acabou e me deu um empurrão para a realidade
arrepiante manchada de vermelho e com uma aura negra. Também eu quero uma
felicidade primaveril, tal como aquela que te desejo. Adeus meu amor. Desejar-me-ás
essa felicidade? Ficarei à espera, sentada na areia da praia a olhar o sol
adormecer no mar e eu vou adormecer com o teu nome invisível nos meus lábios e
um aperto no coração.